quinta-feira, 3 de julho de 2014

“ATRASOS”


Vivo uma melancolia crônica. Faz parte da minha vida, da minha doença, do meu meio show de improviso.

Muitos não veem, não percebem; é que os olhos são “pequenos” em meio a tudo, a um corpo, ao desejo que se pode enxergar. Aí passa batido, a solitária lágrima, o pequeno soluço, o olhar de socorro...

Aí tentei o inverso. Tornei-me reflexo de mim, aparentando quem nada quer, quem tudo pode, resolve, descobre. Quem desrespeita a razão, a lógica, quem “não tem” preço, ou apreço pessoal.

Descobri com o tempo de terapia, que meus desequilíbrios sempre foram motivo de “exaltação e qualidade” para os outros.

Meu não dormir, permitia mais trabalho, mais produção, num horário sempre mais alongado, mais espichado, em dias de cansaço, sem fim.

Minha inquietude, sempre me fez aceitar e carregar tarefas dos outros, como se fossem minhas, numa agenda interminável, e “exaltante”, aonde o prazer nunca passou perto. Aonde a “ajuda” era obrigação, invisível.

O ser “poeta”, ultrapassou a escrita tornando-se um personagem, uma outra pessoa, que fala de alegrias desejadas, prazeres não vividos, de princesas longínquas, de amores e encontros, de vinhos e cafés, que habitam um querer comum.

O que existe, é um gato borralheiro, que lava, passa, cozinha, dirige, corre, paga contas e sonha com as festas da revolução, com a queda do regime, com outro mundo possível... Existe um ser só. Num mundo próprio.

Uma pessoa que passa sem ser notado. Que é um telefone agendado, para se trocar uma lâmpada, para se legalizar um documento, para se justificar e arrumar algumas pendências.

Alguém para se ser encontrar no facebook, e trocar mensagens.

Para se deixar os “netos” no final de semana, porque ser pai, virou ser motorista, ser offboy.

Mal sabem que faço deste encontro com meus netos, mágica, um caminho interplanetário, sem regras ou réguas, um mundo de curvas...

Carrego as contradições de uma vida, de um abandono, de grandes saudades, de escolhas “de coração”.

Hoje já sei o que seria o equilíbrio, mas como sempre me dei por demais, talvez querendo receber um pouco em troca, simplesmente vivo o sintoma da doença.

Desde o câncer, o poeta é bem presente. Fala o que não falo, porém em um outro lugar, diferente do que vivo. Um lugar virtual.

Nunca tive muitos espaços para mim. Chego a me assustar com o desejo, com o homem que sobrevive, e quer continuar desejando, procurando um grande amor.

Dar ao wellington poesia, e ao poeta uma história de vida, é a busca.

Procuro um porto para atracar, viajo a muito tempo, Preciso avistar terra firme, e chegar. Ser parte, ter um lugar.

Navego como um viking, fora de seu tempo, no vazio do mar. Talvez aí a explicação de sempre falar sozinho.

Esta tristeza, vem e vai, em espumas, numa sensação de euforia e infelicidade, numa crise extrema de bipolaridade.

Procuro novos rumos, senão morro em mim; corro em mim, pois já aprendi, que na vida, nem os “ATRASOS” costumam esperar...

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