terça-feira, 16 de setembro de 2008

Uganda é aqui

Os Ilkes ( povo do norte de Uganda ),
e a crise econômica do povo brasileiro

Me lembro ainda, mais ou menos fim da década de 70, era a primeira vez que ia a uma peça de teatro. Ver o trabalho de um pequeno grupo carioca (seguido de debate).
A noite, com suas luzes, me deslumbrava, como até hoje, além da companhia de Vera, Mercedes e outra amiga, aluna da Universidade Rural, que esqueço o nome.
Os Ilkes é um povo que habitava o norte de Uganda, país do continente Africano, que ficou mundialmente conhecido depois de seu folclórico ditador Idiamim Dada.
Faz parte da cultura deste povo, comemorar a “passagem” da vida material, para a “vida espiritual” com festas junto a toda sociedade tribal. Para eles era motivo de orgulho do grupo familiar, comemorar com comida farta, dança e muita alegria, juntamente com toda a tribo, este momento.
Porém com a chegada da fome no continente africano, e a dificuldade da sobre- vivência, cada vez mais ficava difícil socializar o alimento em festas comemorativas ( a família do morto é que bancava a comemoração ).
O instinto de sobrevivência fazia com que a alimentação fosse racionada entre os “vivos” do grupo familiar.
Passou-se então, a qualquer possibilidade de doença seguida de morte, ou fraqueza de qualquer ancião, ser seguida de um “passeio” do familiar convalescido,
sem volta.
Ou seja, havia um abandono na selva do provável morto. Não cabia mais naquela sociedade a possibilidade de gastos gastronômicos. As gorduras haviam se acabado.
Como se avaliava que as coisa iriam melhorar, a verdade da necessidade da comemoração continuava verdadeira. Só que não haviam mais mortes. Só sumiços.
Minha filha Bárbara, de 12 anos, semana passada veio me pedir para suas amiguinhas de colégio passarem o fim de semana lá em casa, pois teriam que fazer um trabalho de grupo da escola.
Reagi de forma até ríspida e preocupada ( me desculpe filha ), que seria impossível tal atividade, pois nós não tínhamos comida nem frutas suficientes para este “weekend”.
A solução não foi fazer esta reunião na casa de nenhuma outra criança, pasmem, e sim segunda feira no período contrário ao das aulas regulares na própria escola.
Nenhuma família reuniu a meninada.
Quase que em seguida, minha mãe foi surpreendida com o telefonema de seu sobrinho, avisando que sua irmã, estava em visita a Brasília, e que iriam visita-la no dia seguinte.
Grande motivo de alegria, afinal a saudade e o tempo sem se verem era grande.
Grande motivo de preocupação, o que servir, quantas pessoas viriam?
Lembro que sai do teatro perplexo, assustado e com pena do povo Ilkes.
Hoje me deparo com a Ugandização de nossa sociedade, com a reforma
neo-liberal, com a globalização da miséria.
Percebo que hoje Uganda é aqui.

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