Anos 80, morava na Rua Alberto de Campos, Ipanema, bem no iniciozinho da rua.
Em um primeiro momento eu ( militante da CS – Convergência Socialista ) e Nelsinho, estudante de Arquitetura da UFRJ, um ex “Libelu”, pois o apto era de dois quartos com dependência.
Logo se juntou a nós, Carminha, minha namorida, funcionária do INPI, ( militante da CS ), filha do ex-Deputado Federal Sergio Magalhães, irmã de Ana Maria Magalhães, atriz da Globo e cinema na época.
Por fim adotamos o Bira, Ubirajara Menezes de Oliveira, mecânico, natural de Vitória da Conquista, ( militante da CS ), um “representante” da classe operária, que nós, jovens libertários socialistas, trouxemos para o convívio de nossa República de Ipanema.
Certo dia, quando chegava em casa, assustei-me com o movimento em baixo do prédio.
Polícia, bombeiros e muita gente.
Era um rapaz que estava no 22º andar, ameaçando se jogar.
Os bombeiros argumentavam, em um diálogo tenso.
A polícia tentava cercar uma área de segurança.
Alguns profissionais dos bombeiros, já tomavam o telhado do prédio, tentando alcançar a viga em que o jovem rapaz estava sentado.
Aos poucos o número de pessoas que assistiam a negociação naquele bairro de elite aumentava.
Opiniões, comentários, especulações sobre o rapaz e o motivo daquela atitude.
Quando derepente alguém grita, “pula!!!!”
Fez-se um silencio e em seguida em coro a população gritava de forma afinada, “pula, pula, pula”, e o rapaz acompanhando o ritmo macabro salta.
Seu corpo bate em outra viga e desvia em direção a uma área interna do prédio.
Por um instante fez-se o silencio.....
Em seguida, como se ninguém especificamente tivesse feito o coro, volta o murmurim do comentário do fato.
O show tinha acabado.
Segui meu caminho para casa indignado.
Passasse mais alguns dias, e novamente chegando em casa, sou recebido pelo porteiro e mais alguns moradores do prédio, meio que assustados, meio que saboreando um novo show.
Era Bira.
Fui informado que ele tinha surtado, e que com o som aos berros, jogava tudo pela janela do apto, 20º andar, e uivava, xingava, etc.....
Subi assustado, ouvindo as histórias e os comentários desencontrados, além é obvio do som explodindo.
Quando abri a porta, Bira estava deitado no meio da sala com um garrafão de vinho vazio, além de outras bebidas.
Logo desliguei o som, e fui montando o quebra cabeça.
Naquele dia ele seria o último a sair de casa, pois tinha uma cliente que faria o motor mas tarde.
Lembrei-me que como ele sempre perdia a chave de nossa casa, orientei-lhe a deixa-la no hall do corredor externo ao apartamento.
Fui olhar, e ela estava ali.
Estava explicado, Bira ficara preso no apto por dentro.
Então na vontade de sair, ligou o som aos berros, logo de manha, na certeza de que o chato do sindico iria vir reclamar, aproveitando o momento para que pegassem a chave que estava dentro da caixa de telefone do hall.
Mas o sindico tinha saído.
Então ficou no aguardo da empregada do lado, que já tinha medo dele, saísse com as duas crianças rumo a escola, para que pedisse o favor de pegar a chave.
Quando a empregada ouviu seus gritos de socorro, misturado com o som e as batidas a porta, correu e nem esperou o elevador, desceu de escada apavorada.
Então ele gritava pela janela, pedindo socorro.
O medo do baiano já se espalhava pelo prédio. Surtou, diziam.
Tentando atingir seu objetivo, Bira encheu um balde dagua, e sem dó nem piedade, deu um banho no primeiro morador que foi buscar o carro na pátio.
Agora seria impossível não virem reclamar. Afinal, as visitas de reclamações eram freqüentes por muito menos.
Mas ninguém foi.
As “razões”, ou não “razões” de Bira eram comentadas não só no prédio, mas na padaria, jornaleiro, açougue, sapateiro, etc.
Por um tempo continuou a jogar água. Em seguida jogou arroz, feijão, farinha até que o desespero de perder a cliente do motor, se transformou em brincadeira, de acertar as pessoas que buscavam seus carros lá no estacionamento,
E a brincadeira se transformou em cansaço, e o cansaço em decepção e embriagues.
Já no final da tarde somente o som das caixas se ouvia.
O silencio do baiano era completo.
A aflição era saber o que tinha acontecido, mais uma morte, mais um louco....?
O caso do rapaz que pulou pelo convite dos moradores, foi logo esquecido.
O caso do Bira, do apartamento dos garotos rebeldes, ainda hoje é comentado.
Tem dois funcionários do condomínio, que toda vez que cruzamos, me perguntam do baiano.
Louco é meu amigo Bira, uma pessoa boa, sensível, fiel, parceira, sempre pronta a buscar e vencer desafios.
Certo são eles, o coral do “PULA, PULA, PULA” de Ipanema.
terça-feira, 10 de março de 2009
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Um comentário:
Bicho,
Arroz, feijão e farinha pela janela, em Ipanema, é impagável!!
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